quarta-feira, 29 de abril de 2020

Etelvina Calendárica e o Caracol Ensebado.....



Todos os habitantes do bairro já se tinham habituado aquela estranha família que fazia uma ronda diária e exaustiva por todos os contentores do lixo. Faziam-se transportar num pequeno tractor que rasgava o silêncio da madrugada, foi concerteza o despertador de muita gente.
Era uma família com quatro elementos, todos eles tão diferentes que pareciam ter vindo de um tempo distante, de um sitio que já não existe.
Aos comandos do tractor e dos destinos da família, o pai. Um homem que aparentava muito mais idade do que aquela que tinha, magro com aspecto cansado, mal trajado com um boné enfiado na cabeça.
Enquanto chefe de família, gestor de negócios e condutor da viatura não abandonava o seu posto de comando. As tarefas de recolha e revista aos contentores estavam confiadas à patroa ajudada pelo filho.
A patroa, uma mulher grande e mal encarada, a própria “Etelvina”, era experiente na arte de revolver o lixo com a ajuda dum pau.
Para a recolha mais selectiva, entrava em acção o filho, conhecido pelo “Caracol Ensebado” que com alguma agilidade e ausência de complexos entrava dentro dos contentores remexendo duma ponta à outra.
Era um rapaz de outro tempo com um ar provinciano daqueles que já não existem, com um ar pacato, mal vestido e sujo, usava um velho boné enterrado naquele pequeno craneo.
Por último a filha, uma miúda muito novinha que acompanhava aquela faina diária contribuindo ocasionalmente nas tarefas mais ligeiras. Apesar de suja e mal vestida dava para perceber que andava ali obrigada e que aquilo não estava nos seus planos.


Isto aconteceu há uns tantos anos, nem me lembro bem mas ainda tenho a imagem daquelas pessoas.


Nota: Etelvina Calendárica e o Caracol Ensebado, não eram estes os seus nomes, nem sei se alguém sabia como se chamavam de verdade….